História verídica de um torcedor
Por: William Cipullo em 28 nov 2012
O encontro com o Brecha
Naquela tarde de outono paulistano, um dia qualquer da semana do ano de 1992, com fome e cansado de procurar apartamento para morar, resolvi relaxar um pouco tomando uma cerveja e comendo um salgado no Elídio Bar, boteco tradicional daquela região da Paes de Barros, conhecido reduto de esportistas e torcedores. A cerveja ia durar o tempo que um outro freqüentador qualquer levaria para beber uma cerveja igual a minha, decidi. Escolhi aquele senhor magro debruçado no balcão do fundo, boa pinta, bigodinho bem aparado, cerveja à sua frente, colarinho digno no copo, uma lingüiça portuguesa meio comida no pratinho branco, o guardanapo de papel, engordurado e coberto de farelos de fritura. Comia e bebia com silenciosa majestade de quem um dia foi rei.
A expressão de seu rosto marcado era uma mistura de nostalgia e nobreza, própria dos grandes guerreiros do passado. Eu conhecia aquele rosto. É ele, tenho certeza. Fui em sua direção: "Eu não sei se o senhor é quem eu estou pensando, mas se o senhor for, me deve um autografo com dedicatória, porque eu sou Juventus por sua causa". O homem virou o rosto lentamente em minha direção, olhar intrigado, como que tentando entender alguma coisa.
Silêncio absoluto no bar, quebrado pelo garçom do boteco, que gritava com a indignação de quem, como eu, queria ver uma injustiça reparada : "É ele mesmo! E ninguém hoje em dia se lembra mais dele! É ele mesmo! É o Brecha do Juventus! É o Brecha do Juventus!". Vi a expressão do velho craque se modificar. Ele abriu os braços e me abraçou como quem abraça um amigo que não vê há muito tempo. Aplausos. Sorrisos. Parecia uma festa.
Conversamos horas a fio sobre momentos de sua carreira. Já era noite alta quando nos despedimos, com um abraço demorado e agradecimentos mútuos. Saí andando, leve como quem acabou de lavar a alma, assoviando, justificado e feliz da vida.
Já ia longe, quando uma voz me chamou, meio esbaforida. Parei e olhei para trás. O velho Brecha, com uma corrida bastante lépida para a sua idade, aproximou-se e ainda ofegante, entregou-me um papel. "Isso é para você. Agora não te devo mais nada", disse ele, com um sorriso maroto. Era um pedaço de papel de embrulho, tornado guardanapo depois de cortado a faca pelo garçom do boteco. Nesse pequeno pedaço de papel, que eu guardo com carinho até hoje, estava escrito a mão : "Ao amigo William, uma lembrança de um juventino", o garrancho autografando, perfeitamente legível : " Moacir Bernardes Brida - Brecha".
William Cipullo
Mooquense de nascimento, juventino de coração e tradição de família, atualmente residindo em Marília/SP, sem perder as raízes.
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